terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Introdução

Apesar de já terem se passado algumas décadas, o golpe civil – militar e as esquerdas armadas ainda são frutos de grandes disputas entre atores sociais que viveram esse conturbado período da história do Brasil.
Na questão judiciária, atores sociais da época ou seus familiares ainda estão envolvidos em processos, na busca de ressarcimento financeiro, fruto da ação dos grupos políticos que tomaram o poder em 1964.
Atualmente persiste a enorme discussão acerca da abertura dos arquivos secretos desse período, ou seja, viriam à tona todos os culpados pelas atrocidades cometidas nos porões da ditadura e consequentemente descobririam a localização dos corpos dos desaparecidos durante o regime.
Mas é no campo da memória que esta relação torna-se mais conflituosa. Grupos sociais que ascenderam ao poder após a queda do regime, reconstroem seu passado a partir do que for mais conveniente em uma determinada conjuntura do presente. Sobre essa questão da memória aprofundaremos mais adiante.
É na legitimação e consolidação do golpe que os meios de comunicação terão papel relevante. A partir da década de 50 os jornais adotaram uma linguagem cada vez mais objetiva. Diante da crise gerada pelo alto custo do papel, a grande imprensa passou a adotar posições políticas cada vez mais definidas e isso foi determinante para o fazer político no Brasil contemporâneo.
No impasse provocado pela renúncia de Jânio Quadros, os grandes veículos de comunicação fizeram suas opções. Alguns se posicionaram em defesa da preservação da constituição, outros apoiavam a intervenção militar.
O jornal O Globo, fonte principal desse estudo, teve uma posição claramente contra a posse do vice – presidente de Jânio, João Goulart1, ou seja, a organização comandada por Roberto Marinho apoiava o projeto político – econômico dos militares.
Grandes embates ideológicos foram travados entre os jornais com o objetivo de conquistar a opinião pública, mas é após atitude de João Goulart com a revolta dos sargentos que a grande imprensa tendeu a uma convergência acerca do posicionamento político, desse modo, parte importante da classe média formadora de opinião começou a deslegitimar o governo Goulart2.
Em tempos de guerra fria, a ameaça comunista propagada pela imprensa com financiamento da elite dominante através dos órgãos do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), levava parcela da população a optar por uma posição anti – Goulart. Até o momento, a opção pela intervenção militar parecia ser a mais convincente.
Com isso, no período pré – 64, a grande imprensa, envolvida nessa campanha ideológica através IPES, apoiou o golpe civil – militar de 1964, tentando legitimar o seu projeto político através da estratégia de propaganda, convergindo a opinião pública à ideologia específica da classe dominante.
Com a consolidação dessa elite hegemônica no poder, veremos que a manutenção da opinião pública a favor do golpe se dará através do consentimento ou da repressão, isto é, alguns veículos de comunicação se colocaram claramente a favor da elite que estava no poder e os que não se submetiam a essa elite sofreram com intervenções e a repressão.
Nessa batalha, a linguagem assume importante papel na disseminação da ideologia dominante. Nesse embate, palavras como guerrilheiro e terrorista tornam - se antagônicas, quase antônimas para a repressão, e assume uma amplitude que foi capaz de qualificar o autor.
Visando dar contribuição a esse campo de pesquisa, este trabalho pretende analisar as diferentes linguagens adotadas pelos jornais conforme a conjuntura política da época. Para delimitar esse tema, optamos pela análise do jornal O Globo durante a vigência da ditadura militar, objetivando contrapô-la a uma linguagem do mesmo jornal na década de 1990, ou seja, no período pós-ditadura.
Nesse sentido nossa hipótese é verificar se há uma caracterização dos atores sociais envolvidos na luta armada contra o regime.
Para efeito de periodização, decidimos dividir o período militar em três fases, de acordo com certo consenso entre a maioria dos historiadores. A primeira fase inicia- se com o golpe militar e vai até a publicação do ato institucional número 5. A segunda fase compreende o período que vai do AI - 5 até a liberalização política, iniciada no governo Geisel, com a revogação desse ato. A terceira tem início no projeto de liberalização política, levada adiante por João Figueiredo3.